domingo, 15 de agosto de 2010

O papel da beleza no culto religioso - 5ª parte: A reforma da reforma


      Continuamos a série de postagens sobre o papel da beleza no culto religioso, da obra de Dietrich Von Hildebrand. Nesta quinta parte falaremos sobre a reforma da reforma:
      "Um dos maiores objetivos do movimento litúrgico tem sido o de substituir orações e hinos inadequados por textos sagrados das preces litúrgicas oficiais e pelo Canto Gregoriano. Assistimos, hoje, a uma deformação do movimento litúrgico quando muitos tentam substituir os sublimes textos latinos da Liturgia por traduções nativas, com gírias. Chegam mesmo a mudar, arbitrariamente, a Liturgia no intuito de “adaptá-la aos nossos tempos”. O Canto Gregoriano vai dando lugar, na melhor hipótese, à música medíocre, quando não ao jazz ou ao rock and roll. Essas grotescas substituições empanam o espírito de Cristo incomparavelmente mais do que o fizeram certos tipos antigos e sentimentais de devoção. Esses eram inadequados. Aqueles, além de inadequados, são antitéticos à sagrada atmosfera da Liturgia. É mais do que uma deformação; isso lança o homem em uma atmosfera tipicamente mundana. Apela no homem para algo que o torna surdo à mensagem de Cristo.
      Mesmo quando se substitui a beleza sagrada, já não pela vulgaridade profana, mas por abstração neutra, incorre-se em sérias conseqüências para as vidas dos fiéis, pois, como indicamos, a Liturgia católica se dirige à personalidade total do fiel. O fiel não é atraído ao mundo de Cristo apenas por sua crença ou por símbolos estritos. São levados a um mundo mais alto pela beleza do altar, pelo ritmo dos textos litúrgicos, pela sublimidade do Canto Gregoriano ou por músicas verdadeiramente sacras, tais como a Missa de Mozart ou de Bach. Até mesmo o perfume do incenso tem função significativa, nesse sentido. O emprego de todos os canais capazes de introduzir-nos no Santuário é profundamente realista e profundamente católico. É autenticamente existencial e realiza função notável em ajudar-nos a elevar nossos corações.
      Se é verdade que considerações de cunho pastoral poderão recomendar como desejável o uso do vernáculo, o Latim da Missa — na missa silenciosa, dialogada e, especialmente, cantada com o Gregoriano — jamais deveria ser abandonado. Não se trata de guardar o latim de Missa por certo tempo até que os fiéis se habituem à missa em vernáculo. Como a Constituição da Sagrada Liturgia claramente determina, é permitido o uso do vernáculo, mas a Missa em Latim e o Canto Gregoriano conservam toda sua importância. Foi essa a intenção do motu proprio de São Pio X, que afirmou ser o Latim da missa, como o Canto Gregoriano, responsável também pela formação da piedade dos fiéis, através da atmosfera sagrada e única gerada por sua dicção. Assim, os anseios de muitos católicos e do movimento Una Voce não se dirigem contra o uso do vernáculo, mas contra a eliminação da Missa em Latim e do Canto Gregoriano. Eles apenas estão pedindo que se cumpra, realmente, a Constituição da Sagrada Litugia.
      Contudo, certos católicos de hoje manifestam o desejo de mudar a forma exterior da Liturgia, adaptando-a ao estilo de vida de nossa época dessacralizada. Esse desejo denota cegueira com relação à natureza da Liturgia, bem como ausência de respeito reverencial e gratidão pelos dons sublimes de dois mil anos de vida cristã. Acreditar que as formas tradicionais podem ceder o lugar a algo melhor é dar provas de uma ridícula auto-suficiência. E esse conceito é particularmente incongruente nos que acusam a Igreja de “triunfalismo”. De um lado, eles consideram falta de humildade a Igreja proclamar que Ela só é detentora da plena revelação divina (em vez de perceber que essa proclamação se fundamenta da natureza da Igreja e decorre de sua missão divina). De outro lado, demonstram ridículo orgulho quando simplesmente assumem que nossa época moderna é superior às anteriores.
      Podem-se ouvir, hoje, razões de protesto declarando, por exemplo, que o texto do Glória e de outras partes da Missa estão repleto de expressões cansativas de louvor e glorificação a Deus, quando deveriam fazer mais referências a nossas vidas. É um contra-senso que revela como tinha razão Lichtemberg ao dizer que, se fosse dado a um macaco ler as epístolas de São Paulo, ele veria sua própria imagem refletida nelas. Admiram-se os nossos “teólogos” modernos não apresentarem, dentro em breve, uma nova versão do “Pai Nosso”, como o fez Hitler. O “Pai Nosso” claramente enfatiza o primado absoluto de Deus, tão distante da mentalidade típica moderna. Um único pedido diz respeito ao bem-estar terrestre: “o pão nosso de cada dia”… O restante diz respeito ao próprio Deus, a seu Reino, a nosso bem-estar eterno".

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